segunda-feira, 4 de abril de 2011

TEMPOS MODERNOS (Cine-Mococa)


Getulio Cardozo

No Cine Mococa está um pedaço da minha infância, o primeiro contato do moleque de Milagre com a modernidade. Com a bengala de Chaplin risco no chão essa singela homenagem.
Eu e meu tio Artur vimos o mar pela primeira vez na tela do Cine Mococa, quando assistimos O Grande Motim. Nos filmes do Mazaropi encontrava com nosso clã caipira e um carro-de-bois levava longe nossa imaginação. Assistindo Romeu e Julieta debrucei pela primeira vez sobre o cangote de uma loira com resfriado e que misteriosamente sumiu do meu lado antes do final do filme.
Devido a minha altura e cara sempre fechada, consegui assistir aos treze anos o primeiro filme pornô. Quando acenderam as luzes fazia um silêncio de cemitério e ninguém olhava na cara de ninguém. Mococa era uma paróquia carrancuda e o cinema nos abria as janelas para a sensualidade.
Por isso o Cine Mococa deve ser visto como uma extensão de nosso quintal, um lugar onde ainda é possível florescer nossa imaginação. Num mundo inclinado ao mercado, a se deliciar no lixo dos programas de TV, o cinema passa ser uma trincheira de resistência. Os tempos modernos de hoje são silenciosos e sem vida, falta a bengala de Chaplin e a florista.
Entretanto, acendo o cigarro e fico pensando: será que tudo isso não é saudosismo e que o Cine Mococa não é uma espécie de fantasma num centro histórico fantasmagórico? Não deveria o Cine Mococa ter outras alternativas culturais além de exibir filmes? Não poderia se instalar ali uma oficina de cinema? Que significado o cinema tem para os jovens da periferia da cidade? Dá para competir com os filmes em DVD?   
São questões a serem discutidas pela nova diretoria que assume nosso cinema, pois acho que o cinema não representa mais hoje o que foi no passado. Dar valor histórico não é simplesmente preservar essas relíquias, mas dar a elas um sentido cultural que não tiveram no passado, redimir o que pertencia apenas a uma elite da paróquia.
 
Observação: o final crítico dessa crônica se deve a uma conversa com o Maycon.

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